Jessé Carvalho Lebkuchen[1]
eu havia perdido tudo
minhas conversas não terminadas, meus dias de sono e cansaço e também os inúmeros momentos felizes por ter conseguido terminar alguma tarefa no último minuto, todas as fotos em que sorria ou não sorria tanto assim fazendo aquela cara de veja como eu sou bonito mesmo me achando um bosta, minhas músicas que guardava desde a adolescência com tanto carinho mas tudo bem eu nem escutava nenhuma mesmo e os cds que eu mais gostava e outros que eu nem sei porque comprei estão todos ali empoeirados na estante não tem problema, perdi meus escritos horríveis mas eu tinha um zelo por eles porque sei lá se eu escrevi eles um dia é porque eu fui aquilo ou talvez não era só pra passar a insônia e fingir que estava tudo tranquilo pode dormir dorme que já são sete da manhã porra, meus filmes do almodóvar que eu já nem sei se gosto tanto assim ou se era só pra poder dizer que tinha um diretor de cinema preferido, perdi a vontade de sair de casa e dar bom dia pro cobrador mesmo tendo que correr atrás do ônibus porque perdi a hora como sempre ah e o cara nem olha pra minha cara mesmo, perdi tanta coisa que nem consigo enumerar e tem coisas que nem me importo de ter perdido tanto faz, meus pais irmãos amigos gente que eu me importava e agora nem lembro a voz as implicâncias o que me fazia gostar ou odiar, perdi as lembranças boas e ruins eu acho que nem faço questão de não esquecê-las porque tá já passou foi amanhã eu terei outras pra lembrar, perdi amores e outros que nem eram tão amores assim, perdi a voz o ar o som o lar o
desaparecido.
[1] Graduado em Letras – Português e Espanhol pela Universidade Federal de Pelotas (2017). Atualmente cursa Mestrado em Letras na Universidade Federal de Pelotas, na linha de pesquisa Literatura, Cultura e Tradução, e Especialização em Linguagens Verbais e Visuais e suas Tecnologias no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense.
